1. Boa tarde a todos!
O Alentejo é
silêncio, mas não é solidão, é solidário…. É por isso que estamos aqui hoje… O
lançamento de um livro é um momento de vida feliz; há nele qualquer coisa de
estranho na expetativa que envolve o seu autor, a(s) sua(s) temática(s), o(s)
seu(s) local (-is) de apresentação e até os silêncios ou os risos respeitadores
das opiniões daquele que sobre a obra fala…
2. Quando
em Julho de 2010 no Pré-lançamento de Ester Leão Uma Actriz da República de
minha autoria na XIX Mostra de Artesanato, Gastronomia e Actividades Económicas
do Concelho de Gavião, fui procurado por uma amigo, que há bastante tempo não
encontrava, pois as vicissitudes da vida para isso nos impelem… dizendo-me que
tinha produzido um conjunto de escritos, mas não sabia se tinham valor para
serem publicados. Predispus-me a ajudá-lo, pensando no meu próprio caso em que
a insegurança, o medo do público ou da crítica pudessem matar à nascença o que
ainda mal tinha nascido…
Ao
longo de um ano e-mails, SMS,
telefonemas e alguns breves encontros, em que foram trocadas ideias, situações,
sugestões e experiências na base do respeito pela identidade criadora, aceitando
conteúdos e dando apenas pequenas pinceladas formais…
A
obra nasceu e quis o destino que Margem de Sonhos fosse apresentado pela 1ª vez
a público no mesmo certame e no concelho de ambos, em que eu no ano anterior
tinha lançado mais um pequeno e último opúsculo….
O
seu autor, o meu amigo João Matos, mais conhecido por Serôdio, entretanto
convidara-me a escrever um texto para introdução do seu, agora já livro,
conjunto de escritos….
3. Naturalmente
acedi, era quase impossível não o fazer e saiu Em Jeito de Prefácio Tradição e Modernidade
em Margem de Sonhos... Não mais do que uma leitura apriorística de quem apenas
tinha lido antes de todos os outros leitores o resultado da dedicação quase
inflamada e incansável do João Matos e que na versão publicada aparece mesmo
como Prefácio.
Para
esse introito baseei-me, refletindo, nas investigações de autores que respeito
e aprecio com obra produzida sobre as coisas da cultura, desde logo começando
por louvar o nosso Nobel José Saramago falecido em Junho de 2010 e a epígrafe
do Ensaio sobre a Cegueira (1995) caía como sopa no mel para introduzir desde
logo algumas linhas de força de Margem de Sonhos como a memória da vida e esta
com responsabilidade….
4. A temática da
memória é cara a antigos e a modernos e queria destacar o estudo do meu grande
amigo Professor Luís Martins Fernandes, sobre Miguel Torga, outro dos nossos
grandes mestres…
Expressões da Identidade Nacional em
Miguel Torga, no Prelo, a publicar pela Fundação Calouste Gulbenkian
por estes dias…
5. Não
podia olvidar no séc. XIX, Mouzinho da Silveira, alentejano de Castelo de Vide,
personalidade maior da nossa história que à freguesia de Margem é grato, e que
nas suas ações interventivas em prol da nossa sociedade lhes atribuiu um caráter
social, mais profundo e fecundo que o da intriga pessoal, ou de sonhos
doutrinários ou dinásticos…
6. Trouxe,
na Tradição Popular também à liça talvez o maior escritor gavionense de todos
os tempos, Pequito Rebelo, pelo seu apego ao Ultramar, para ele uma tradição
bem portuguesa… e pela ligação a outra linha de força de Margem de Sonhos, a da
Guerra Colonial…
7. A
temática da Viagem, física ou mítica, a pé, de carro de aluguer, de barco ou
comboio… é recorrente na Literatura Portuguesa, para isso muito contribuiram os
Descobrimentos e toda uma produção dos relatos marítimos… Fernão Mendes Pinto,
Camões, Diogo do Couto, Pêro Vaz de Caminha entre outros… No século XIX, queria
destacar as Viagens na Minha Terra de
Almeida Garrett que por sua vez tinha bebido de Xavier de Maistre, no Séc.
XVIII, e da Viagem ao Redor do meu Quarto. No séc. XX Fernando Pessoa dizia:
“Viajar! Perder países”, talvez pela sua vivência na África do Sul e pela
distância da pátria lusa….
8. Desculpem-me
a imodéstia, mas queria citar duas obras de minha autoria sobre o maior
dramaturgo gavionense, Francisco Ventura, a 1ª Francisco Ventura: Dramaturgo do
Efémero e do Eterno e Francisco Ventura: Um Dramaturgo Popular, título de Tese
de Mestrado sobre um quadro do artista plástico gavionense Eduardo Mariano. Francisco
Ventura cujas obras pisaram palcos como o Nacional, ou abriram longos caminhos
radiofónicos e até estrearam teatro na TV… obras exemplares daquilo que eu classifico
como cultura popular…
9. Dentro
da mesma temática, cito ainda duas obras de autores intimamente ligados à
freguesia de Margem, João Galinha Barreto e os seus Caçadores de Paixões, 2010…
10. E Natália Mª Lopes Nunes da Graça, Formas do Sagrado e do Profano na Tradição
Popular (Literatura de Transmissão
oral em Margem [Concelho de Gavião]), 2000… exemplos de manifestações
culturais ligadas à festa popular…
Deixemos
o Prefácio, voltemos a Margem de Sonhos e observemos o produto final: Edição de
Autor, o que demonstra audácia, apesar dos apoios institucionais da CMG, Junta
de Freguesia de Margem e REFER, a quem agradece…
Capa
fora do comum pela tonalidade escolhida e pela imagem sobre o real…
Badanas
à moda antiga, 1 com pequena ficha biográfica e fotografia esbatida do nosso
autor, a outra, homenagem a Mouzinho da Silveira com imagem do seu busto
erigida em Vale de Gaviões, freguesia de Margem…
Sinopse
na Contracapa…
Dedicatória
emocionada à família mais chegada…
Explicações
e Agradecimentos para não haver melindres… a quem o ajudou e a alguns dos
protagonistas….
1
Introdução, justificações em apurada prosa poética…
31
Capítulos, todos com um pequeno texto como ponto de partida para a história que
irá ser narrada…
20
Notas de rodapé, explicativas, apontando para a consulta de fontes…
21
Créditos fotográficos, muitos do seu espólio pessoal e familiar, mas também de
terceiros a quem no final agradece….
11. Observemos
o Índice para ver o que vos espera
12. Foi
aqui que tudo começou, no Hospital D. Mariana… em Gavião… agora transformado em
Lar de 3ª idade… propriedade da Santa Casa da Misericórdia de Gavião com um
trabalho de solidariedade notável, local de nascimento do nosso autor que
remete já para a perspetiva autobiográfica de Margem de Sonhos…
13. Imagem
que aponta para uma das linhas temáticas mais fortes a da Família, com respeito
como manda a Tradição…
14. Linha
de força fundamental, a Escola, memória também da infância, dos seus
companheiros de aprendizagens e maroteiras (o Zé-Meia-Noite, a Umbelina, o
Chico Preto, a Joaquina ou o Tonho Patife…), a que dá destaque nas histórias
narradas; queria chamar atenção para outro protagonista desta linha de força, a
Profª Maria Clara Correia, aqui presente a quem presto a minha homenagem, não
há escolas sem Professores, não há memórias de infância sem essas recordações
que nos marcaram…
15. Para
além da Professora outras figuras gravitavam na época, o Pe. Manel, Pároco da
freguesia de Margem e Professor em Ponte de Sôr, o Dr. Mário de Almeida, médico
da freguesia e Delegado de Saúde de Gavião. Poderia citar outros, por Exº o
Carteiro Herculano ou o velho Tanicha poderiam perfeitamente figurar nesta
caracterização local de protagonistas e figurantes….
16. A
Guerra Colonial e dois dos seus protagonistas, João Serra dos Santos (conhecido
como João Barreto, alcunhado de João Fataça e/ou o Rei da Cuca), e o Furriel
José António Rodrigues, nosso conterrâneo,
quase parente, heroico e saudoso, nela desaparecido, merecedor de
ser relembrado…
Margem
de Sonhos presta assim uma sentida homenagem a vivos e a mortos…
17. Da
Guerra Colonial ao 25 de Abril e deste a Salgueiro Maia, outra linha temática
bem inserida em Margem de Sonhos… Salgueiro Maia, personagem principal da nossa
História recente na passagem da noite escura para a manhã clara como apontava
Sophia de Mello Breyner Andresen... que aqui aparece numa faceta desconhecida
do grande público, a da ligação familiar e laboral a Torre das Vargens…
18. Em
Margem de Sonhos a temática da viagem está muito presente, tirando as de
comboio, efetivas, as outras são sonhadas, à semelhança de Xavier de Maistre, à
volta do quarto de João Matos.
19. A
Festa, sagrada e profana, mas sobretudo popular em prol de um objetivo prioritário:
neste caso o de angariar fundos para a construção do Posto Médico, Igreja e
Casa Mortuária… uma realidade possível pela entreajuda e esforço de muitos na
senda do Bem Comum
Se
Margem de Sonhos não é um tratado da
cultura superior para as elites emergentes e rodopiantes, antes pelo contrário
é reflexo popular, porque o povo é o esteio da nossa identidade. Entre outras
qualidades, não dispensa leitura e reflexão, porque apresenta ambiências,
gentes com seus rituais e festas… um enraizamento telúrico e a autenticidade da
cultura popular, aquela que há muito defendo, estudo e difundo, porque se a
arte é o espelho do povo, Margem de
Sonhos é, também, o reflexo do povo alentejano, de Margem ou de Gavião, de
Ponte de Sôr, em suma do nosso Alentejo, que é silêncio, mas não solidão, é solidário
até nos sonhos de Margem… alguns concretizados.
E
nada mais digo sobre o conteúdo, porque senão ninguém vai ler MS, fica em suspense…
20. Umas
palavras para o nosso novel autor, João Matos que em Margem de Sonhos, cria um
processo também de autodescoberta, a frequência e a validação de competências
nas Novas Oportunidades ou a adoção do Novo Acordo Ortográfico, recheado de
afetos, com uma escrita atual, simples, direta, nada densa, originando uma obra
com mérito, obra de parte de uma vida, que espero tenha continuidade, porque se
as palavras são importantes, mais importantes são o que metemos dentro delas, o
coração!
Margem
de Sonhos deixou de ser DELE e passou a ser NOSSO!
Votos
de felicidades pessoais e profissionais, com um abraço… do João Florindo
Uma
palavra final para o patrono deste encontro o município de Ponte de Sôr e o
Centro de Artes e Cultura que não conhecia, um município que aposta na cultura
é com toda a certeza um município mais rico…
João Manuel Alves Florindo
Nenhum comentário:
Postar um comentário